Um país aos pedaços: Greenwald denunciado, Guedes em Davos, nazismo na Secretaria da Cultura e Bolsonaro
Em 21/06/2018, em uma matéria do G1, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Luiz Fux, afirmou que o Judiciário poderia anular a eleição, caso o resultado fosse influenciado por fake news em massa (1). Passada a eleição presidencial, foi mais que provado que isso aconteceu. Até mesmo Brittany Kaiser, cientista pivô do escândalo da Cambridge Analytica na eleição de Trump, afirmou que foi usado o mesmo método das eleições dos Estados Unidos aqui no Brasil, utilizando empresas semelhantes a Cambridge Analytica para “espalhar desinformação, viralizar notícias mentirosas, persuadir eleitores” (2). A única mudança foi a troca do Facebook pelo WhatsApp, no caso brasileiro. Pergunto: o que aconteceu? Nada, absolutamente nada. Portanto, tivemos eleições fraudadas por fake news e nada foi feito. A eleição de Bolsonaro, pelo que acabamos de apontar, foi uma farsa tão grande quanto o impeachment de Dilma, numa clara demonstração de poder das elites que ora estão no comando desse país.
O que começou errado não poderia se acertar. Tantos acontecimentos maléficos pulularam durante essa parte inicial do governo Bolsonaro que nem poderíamos listá-los, mesmo que esse texto fosse um livro. Por esse motivo, falarei, a partir de agora, apenas sobre os fatos tenebrosos mais recentes.
Em vídeo postado em 16/01/2020, o agora ex-secretário da Cultura, Roberto Alvim, parafraseou o ministro da Propaganda de Hitler, Joseph Goebbels, ao anunciar a liberação de verba para o Prêmio Nacional das Artes. Além da paráfrase, Alvim fez questão de utilizar uma estética totalmente nazista para seu vídeo e descrever objetivos que são os mesmos do regime de Hitler. Num primeiro momento, Bolsonaro defendeu seu secretário, mas, em virtude de pressões externas, principalmente de Israel, acabou por exonerá-lo. Entretanto, o pior de tudo, é que os objetivos citados por Alvim são aqueles de todo o governo Bolsonaro. o que remete a uma espécie de nazismo estrutural. Nesse novo nazismo estrutural do governo, os judeus não são perseguidos, uma vez que o governo precisa deles, mas outros grupos sofrem com a perseguição. Todavia, isso deveria acender um alerta para toda comunidade judaica, uma vez que o preconceito em relação a ela já está acontecendo, mas de maneira bem velada (3).
Bolsonaro resolveu não ir ao Fórum Econômico de Davos de 2020. Em seu lugar enviou Paulo Guedes, seu ministro da Economia. Em painel promovido por esse fórum, Guedes culpa os pobres por todos os problemas ecológicos encontrados na Amazônia, afirmando que “o pior inimigo do meio ambiente é a pobreza” e explicando que as pessoas (os pobres) destroem o meio ambiente pois “precisam comer” (4). Mais um absurdo, uma vez que todos sabem que os verdadeiros responsáveis estão o mais longe possível da linha da pobreza. Entretanto, com essa mentira ele acerta dois dos seus grandes inimigos: os pobres e o meio ambiente.
Hoje, 21/01/2020, o Ministério Público Federal (MPF) apresentou denúncia contra o jornalista do site The Intercept Brasil Glenn Greenwald e outras seis pessoas, passando por cima da Constituição e do Supremo Tribunal Federal. Apesar de não ter sido investigado ou indiciado e de ter uma medida cautelar do ministro Gilmar Mendes para ““determinar que as autoridades públicas e seus órgãos de apuração administrativa ou criminal abstenham-se de praticar atos que visem à responsabilização do jornalista Glenn Greenwald pela recepção, obtenção ou transmissão de informações publicadas em veículos de mídia, ante a proteção do sigilo constitucional da fonte jornalística” (5), o procurador Wellington de Oliveira resolveu discordar disso tudo e denunciou Greenwald, afrontando todo sistema de justiça brasileiro (6).
Todas as entidades sérias de defesa da imprensa e dos jornalistas já se pronunciaram contra o procurador. Abraji (Associação brasileira de Jornalismo Investigativo), Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) e ABI (Associação Brasileira de Imprensa) fizeram duras críticas ao MPF, considerando o fato um ataque à liberdade de imprensa e uma tentativa grotesca de manipulação (7). A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também se manifestou e declarou que “a denúncia descreve fato que não pode ser considerado crime” (8). Algo que também chama a atenção é o fato de que o procurador Wellington Oliveira é o mesmo que denunciou o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, por calúnia contra Sérgio Moro (9). Também a ONU já entrou nesse caso, pedindo explicações do governo brasileiro, através de David Kaye, diretor sobre liberdade de expressão da organização (10).
Esse verdadeiro ataque à liberdade de expressão, ao jornalismo e à imprensa, apenas demonstra que o Brasil está desintegrando como país e que todas as suas instituições estão tendendo a voltar a um estado de natureza em que impera a força, a trapaça e a mentira. Não sei, sinceramente, até que ponto o país aguentará. Um caso como o de Greenwald é lapidar para que entendamos tudo o que está acontecendo. Há, já no momento, uma lei sobre abuso de autoridade vigorando e somente através de sua aplicação é que poderemos esperar que as instituições comecem a ganhar algum fôlego para continuarem verdadeiramente existindo (11).
Alexandre L Silva.
Notas:
(3) Leiam a seguinte matéria do G1 que, apraentemente, é favorável a Bolsonaro e observem como Bolsonaro sai pela tangente quando questionado se serviria ao exército de Hitler: https://g1.globo.com/fato-ou-fake/noticia/2018/10/18/e-fake-que-bolsonaro-disse-em-video-que-teria-se-alistado-ao-exercito-de-hitler.ghtml
(5) http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=419222
(6) A justificativa do procurador para afrontar Gilmar Mendes é a seguinte: “A referida decisão criou uma espécie de imunidade especial e material jure et de jure, uma presunção absoluta de inocência, garantindo um “salvo conduto” ao réu de ser investigado”, terminando por concluir que “não houve investigação. Não se descumpriu a decisão”. Vide: https://www.conjur.com.br/2020-jan-21/mpf-denuncia-glenn-seis-hackearem-autoridades
(11) Sobre o posicionamento do The Intercept Brasil: https://theintercept.com/2020/01/21/nota-intercept-glenn-mpf/