Como deveria ser conduzida a necessária investigação do caso Marielle e Anderson e sua relação com Bolsonaro
Jair Bolsonaro, no dia dos mortos de 2019, afirmou para a imprensa: “ pegamos toda a memória da secretária eletrônica que é guardada há mais de ano. A voz não é a minha” (https://brasil.elpais.com/brasil/2019/11/02/politica/1572728129_887853.html). A primeira pergunta que nasce dessa afirmação é: o pronome nós faz referência a que pessoas? E a segunda: como um presidente confessa a prática de um ato ilícito com tamanha naturalidade?
Evidentemente, a afirmação do próprio Bolsonaro não serve para provar nada. Um suspeito não pode, sendo quem for, desaparecer com uma prova e dizer que ela não o implicava; é surreal. Além do mais, a prova, após sua manipulação por Bolsonaro e os seus, perde praticamente, ou totalmente, seu valor e, ao mesmo tempo, o torna praticante de um ato criminosos, além de aumentar as suspeitas sobre ele. Tudo isso se vivêssemos num Estado Democrático de Direito.
Bolsonaro argumenta que não poderia ser sua voz, já que está comprovado, através de inúmeras aparições. Que estava em Brasília. Entretanto, levanto uma hipótese: e se o porteiro tiver falado com um telefone em viva-voz. Poderia estar falando com Bolsonaro e, mesmo assim, Bolsonaro estaria no Distrito Federal.
Estando a prova em posse de Bolsonaro, ele deveria entregá-la para as autoridades competentes, apesar de todo prejuízo já deflagrado à prova. Dizer que a prova sumiu ou que a destruiu só pioraria, ainda mais, a sua situação. De uma forma ou de outra, uma pessoa nessa situação, sem interferência política, já deveria ser considerada suspeita.
O sumiço da memória acaba por fortalecer a importância do livro de entrada da portaria. Nesse livro, já bastante documentado, inclusive através de fotos, o porteiro anotou o carro de Élcio Queiroz, sempre Queiroz, sendo liberado pela casa 58 do condomínio, a de Bolsonaro. É importante frisar que o livro não está rasurado e está preenchido por linhas antes e depois da anotação da liberação do carro de Élcio, ou seja, não seria possível estar adulterado. Assim, o livro remete para a liberação do carro de Élcio Queiroz, que juntamente com Ronie Lessa, praticou o crime contra Marielle e Anderson, por alguém na casa de Bolsonaro. Esse alguém, segundo um duplo testemunho do porteiro é um homem, que ele reconheceu, pela voz, como sendo “Seu Jair”. As alternativas para validar o testemunho do porteiro são duas. Primeira, haveria um homem na casa de Jair Bolsonaro que liberou o carro (aqui, é bom lembrar, o próprio Jair Bolsonaro numa live feita após o caso ser divulgado pela Globo, afirmou, de maneira indireta, que sua mulher estava em casa). Segunda, o próprio Bolsonaro liberou o carro, sendo utilizado, como supomos antes, o telefone em viva-voz. Para jogar alguma dúvida sobre essa segunda hipótese, seria necessário liberar o sigilo telefônico de Bolsonaro no dia. Isso não impediria que ele tivesse feito, ou recebido, a ligação de um outro telefone, mas ajudaria nas investigações.
Apenas o sumiço da prova já seria suficiente, num país democrático, para a tramitação do impeachment de Bolsonaro e o início da investigação sobre ele. Entretanto, como o próprio EL País, no endereço acima, há sombras que cobrem todas as instituições que estão envolvidas nesse caso. Caso nada ocorra, está decretado o fim da democracia e da lei no país.
Alexandre L Silva